Em Portugal, idosos aprendem a “gingar” com mestre de capoeira brasileiro
Financiado pela Câmara Municipal de Leiria, no centro de Portugal, o projeto “Gigando na Melhor Idade” tem feito sucesso entre os residentes de um lar de idosos da cidade. A ideia partiu do paraibano Jimmy Almeida, que pratica capoeira há 28 anos. Fábia Belém, correspondente da RFI em PortugalSegunda-feira é dia de capoeira no lar de idosos Eira da Torre, localizado em Leiria, a cerca de 150 quilômetros de Lisboa. As aulas começaram há quatro meses e têm melhorado a saúde física e mental dos idosos. Quem financia é a câmara municipal da cidade, que tem funções parecidas com as das prefeituras brasileiras, mas a ideia partiu do capoeirista paraibano Jimmy Almeida, também conhecido como “Mestre Papagaio”. Natural de João Pessoa (PB), Jimmy vive em Portugal desde 2000 e pratica capoeira há 28 anos. Foi no Brasil, com o “Mestre Naldinho”, que adaptava capoeira a crianças com síndrome de Down, que Jimmy percebeu que a prática também poderia ser “um veículo de inclusão, e que qualquer tipo de dificuldade poderia ser ultrapassado com a capoeira”, garante.As aulas têm duração de 45 minutos e começam sempre com canções tradicionais de capoeira. “Ensinamos uma música nova e eles respondem em coro. Há sempre uma troca de brincadeiras, porque eles não passam sem isso”, conta Jimmy. Quanto à parte prática,“a gente adapta muito para a situação [dos idosos]”, observa, já que 85% deles se mantêm sentados durante todo o tempo, em razão da dificuldade de mobilidade.“Fazendo a ginga”O mestre explica que não costuma realizar “um grande alongamento com os idosos” por não haver necessidade. Segundo Jimmy, os próprios movimentos da capoeira já alongam o corpo. Um deles é a ginga, "que é a base de tudo”, diz o professor. Essa é, aliás, a primeira lição que se aprende.“Fazemos a ginga da parte superior: dos braços. Então, o idoso vai colocar um braço na frente do rosto e o outro braço de lado [esticado]. Ao tentar esticar o outro braço na altura do ombro, ele já está alongando o ombro. O trabalho de ginga é trocar isso de um lado para o outro”, detalha.Dono de uma academia de capoeira, em Leiria, Jimmy reforça que o importante é conseguir que os idosos participem “fazendo a ginga da maneira deles, da maneira que o corpo deles permite que eles façam capoeira". Segundo o professor, "depois, vêm os alongamentos e o fortalecimento muscular”. Emília Barbosa tem 88 anos e conta à RFI que aprendeu a gingar só com os braços, devido à impossibilidade de mexer as pernas. “Mas faço, é muito bom”, diz com satisfação. Aos 79 anos, Dionilde Ferreira gostaria de “pôr as pernas ao ar”, como faz o "Mestre Papagaio", “mas isso nós não podemos, infelizmente”, lamenta, sem perder o bom humor. No começo do projeto, muitos dos 64 residentes não demonstravam interesse pela nova atividade, de acordo com Jimmy. Mas, atualmente, “90% deles participam do projeto”, comemora o professor. Para Margarida Feliciano, animadora sociocultural do lar, isso também foi possível porque o capoeirista brasileiro cativou os idosos, “conseguiu tocar-lhes no coração”.Emília, por exemplo, fica ansiosa aguardando a chegada das segundas-feiras. “Tô sempre à espera. Estamos todos. Quem gosta, está à espera. Eu adoro o professor Papagaio”, diz.Bem-estar geralOs residentes do Lar Eira da Torre têm conhecido os benefícios da capoeira: melhoria do desempenho físico, da coordenação motora, da concentração e muito mais. “A arte da capoeira tem esse poder”, celebra o mestre.Dionilde confirma: “fico mais bem disposta e contente. É um dia diferente”.Pelo que tem observado, a animadora sociocultural assegura que as aulas de capoeira têm promovido bem-estar geral. “Eu noto, essencialmente, muita alegria, boa disposição, até uma melhor interação entre uns e outros, que é de extrema importância. É um projeto que tem asas para voar e que irá fazer muito bem à nossa população, que é maioritariamente envelhecida, e que precisa desta motivação. Realmente, é uma experiência muito positiva que todos deviam experimentar”, frisa Margarida.“Orgulhosos pelo trabalho que fazem”Jimmy ministra todas as aulas com a ajuda da esposa, a capoeirista Joana Palhas, a “Professora Beringela”, como também é chamada. Ela conta que a utilização de instrumentos como berimbau, pandeiro, agogô e reco-reco também tem sido importante para o trabalho com os idosos.“Alguns não têm muita mobilidade com a mão, por exemplo, mas só [de] agarrarem no instrumento e balançarem quando conseguem, já é ótimo. Eles próprios se sentem orgulhosos pelo trabalho que fazem, o pouquinho que fazem”, lembra.“Isso é mais um presente que a capoeira me deu. É muito positivo, é muito gratificante”, reforça Jimmy. Por enquanto, apenas o Eira da Torre está acolhendo projeto, embora o "Mestre Papagaio" e a "Professora Beringela" tenham disponibilidade para levá-lo a outros lares, “desde que a gente consiga patrocinadores que consigam apoiá-lo”, avisa Jimmy.